Tens montes de Vénus dentro de ti. És sedutora. Desenvergonhada. Desvairada. Tórrida. Lânguida. Ardente. Fulminante. Serei algum dia o teu alpinista?
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Um dia passaste com a língua pelos lábios e eu apaixonei-me de imediato por ti. Sem remissão, num abrir e fechar de olhos, tiro-e-queda: sou teu, faz de mim o que quiseres. No minuto seguinte, arrotaste. A núvem em que subia subitamente dissipou-se.
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Tentava tirar de ti os olhos, expressão máxima do teu corpo, acredita. Tentava imprimir a linguagem do teu olhar no meu, copiar de forma perene a imensa luxúria da placidez e doçura em que me envolvias, mesmo se de tal não te apercebesses. Esta mulher, dizia eu, não mente, nunca mentiu. Como pode ela, com aquele olhar? Até que um dia me confessaste usares lentes.
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Faz de mim o que quiseres, desde que me sacies. Farei a ti o que desejo que me façam. Sacia-te saciando. Saracoteia-te até aqui, até mim. Aguardo-te, guloso. Tira a embalagem. Livra-te do invólucro. Deixa-me saborear-te assim mesmo. Deixa-me enriquecer-te com cada palavra. Cada som, uma língua. Nua.
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Cada palavra uma pérola para te esfregar no corpo, para massajar o desejo. Avança para mim devidamente acicatada no teu orgulho predatório. Deixa-me fingir ser a tua presa. Serás a minha prisioneira. Brinca contigo como eu o faço. Usa as tuas mãos com princípios, meios e fins. Aqui me tens a meio. Veremos o fim? Já estás nua? A prisão do desejo em pequenos jeitos, trejeitos e remoques. A imensidão da luz que te entra nos olhos é apenas um pequeno princípio. Um princípio não cuspido ainda, como o foram tantos pequenos sonhos, pesados desejos e elásticas ilusões pretéritas. Mas o pretérito é isso mesmo: passado. Agora estás aqui, não estando. Continuas um objeto colocado no centro da sala do meu cérebro, sem decidir ainda se ultrapassarás alguma vez o tal estado de ensejo. Prevejo-te uma imensidão de luz, já to havia dito antes, quando nem mesmo eu sabia. Sento-me, acendo um cigarro e afundo a cabeça entre as mãos. Sinto-a descer, numa vertigem precipitosa. Quando entrares aqui, não vou ver. Só espreitar. Só te verei quando acreditar. Quando acreditares.
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Atempadamente expelindo o fumo do cigarro. Noto ainda na diferença de cor deste fumo, do azul acinzentado mais brilhante saído dos pulmões. Quero expelir atempadamente todo o fumo do meu corpo. Apetece-me, a partir de agora, inspirar apenas o teu perfume.